Diva Oliveira nº12
Querido Diário,
Hoje não sei por onde começar … Poderia dizer que cheguei ao aeroporto e tal, tal, tal. Mas prefiro informar-te primeiro de onde estou: hoje comecei uma das maiores aventuras da minha vida: neste momento estou no quarto do hotel deitada em cima da cama, a escrever, depois de um tão longo dia que foi este. E sabes onde é esse hotel? No Líbano, precisamente em Beirute.
Foi um dia curioso acima de tudo, por um lado porque hoje senti que estou a ver para além daquilo que estava tão habituada, àquelas 4 paredes da minha casa, àquele país, àquelas culturas e a todas as tradições, já metódicas. Aqui no Líbano, é difícil explicar: tento parecer-me ao máximo como uma local, para isso fiz questão de não usar decotes, nem saias curtas, nada de partes do corpo muito expostas, e como o esperado, comprei uma linda burca lá num mercado. Era sem dúvida um mercado encantador, nada a ver com os de lá de S. João. Era um mercado ao ar livre, mas em tudo havia cores, música típica, cheiros exóticos, era o verdadeiro testemunho de uma cultura à qual ainda me estava a adaptar. Por cada passo que andava, via mais uma especiaria, ou algo que a eles chamam “comida”, mas comer aquilo? Nem me atrevo!
Mas voltando ao início… quando cheguei ao aeroporto de Beirute, depois de horas e horas de viagem, e de constantes mudanças de posição para conseguir encontrar a mais confortável para uma soneca, a minha barriga dava horas e apressei-me a ir buscar as malas e encontrar um café. Saí a correr do aeroporto e parei numa tasca engraçada, li a ementa e nada me soava bem, por isso optei por escolher o “hommus”, mas rapidamente me arrependi. Estava eu sentada numa mesa, a apreciar a paisagem, quando a minha tão esperada comida chegou, deparei-me com uma mistura cor de pele, que pelos visto, era feita de puré de grão-de-bico e pasta de ervilhas. Nem sequer foi capaz de me atrever a comer … Apenas paguei, e regressei ao que me interessava: descobrir a magia de todo este pais!
Tive então que planear bem o que queria fazer neste dia, sendo assim, decidi que primeiramente iria visitar a Mesquita Haj Bahaa – um dos grandes símbolos da religião islâmica, a peça central do país. Tentei envolver-me um pouco do clima dos muçulmanos e desfrutar ao máximo de toda a paz e bem-estar que aquele sítio me transmitia.
Precisava realmente de comer, e desta vez, optei por um restaurante em frente à Mesquita no qual se encontrava muita gente, e tive mais cuidado em informar-me acerca da ementa. Portanto acabei por comer uma salada com folhas de hortelã e salsa, que se não me engano, chamava-se “tabbouli”, claro que nada comparado ao arroz de pato da minha mãe!
Digamos que até aqui, poderia descrever o Líbano como um país óptimo, com grandes costumes, gastronomia e uma imensidão de coisas por descobrir. Mas foi então que … Durante a tarde, enquanto tentava dirigir-me para a zona central da cidade, para ir ao mercado que já referi anteriormente, cometi um erro e enganei-me no caminho. Só aí me apercebi da grande desigualdade que havia com as mulheres: a diferença entre o lugar que homens e mulheres ocupavam na hierarquia da sociedade. Os homens eram autênticos donos das mulheres, e nem elas próprias tinham noção do quanto eram oprimidas e desrespeitadas. As mulheres Libanesas não têm direito a nada, têm de seguir uma beleza e um comportamento já delimitado para que a sociedade as aceite. Têm direito à educação, mas não da mesma forma que os homens, não podem ser donas de empresas nem de identidades públicas, não podem dar nacionalidade aos filhos, não podem fazer nada sem os Homens por perto.
Senti-me ridícula ao ver aquelas mulheres, ao ver ao que se tinham de rebaixar e aceitar para que a sociedade não lhes desse nada em troca, o que tinham de fazer para sobreviver simplesmente. Tentei sair o mais rápido possível daquela zona, e consegui com alguma facilidade regressar ao centro de Beirute, e explorar todo aquele mercado.
Quando dei por mim, estafada, o dia já se tinha perdido, e já era hora de jantar, para chegar cedo ao Hotel e aproveitar a noite para descansar. Acabei por ir a um restaurante muito conhecido no centro e lá tive o prazer de dançar “dabke”, uma dança típica, em que várias pessoas dançam ao mesmo tempo de mãos dadas, e andam em círculos através dos passos que as conduz.
E agora estou aqui, a escrever… A grande conclusão que tiro deste dia é que por detrás de uma paisagem digna de um filme de Hollywood como esta, podemos descobrir o lado obscuro de uma sociedade e cultura.
Amanhã será um novo dia, mas a ideia constante que atravessa a minha mente, faz-me pensar realmente o lugar que a mulher toma no mundo! O mundo não é dos Homens, é de todos nós, por isso, é cada vez mais importante, que nós, MULHERES, mostremos todo o valor que se esconde por detrás de cada uma, e o quanto todo o Mundo e todos os Homens precisam de nós. Sinto-me feliz, porque acredito que vou enriquecer muito com esta cultura e que de certa forma estou a conseguir envolver-me nela, sentindo tudo de todas as maneiras.
São 7h da manhã, surpreendo-me a mim mesma e levanto-me logo que ouço o som incomodativo do meu fabuloso despertador. Levanto-me com gosto, coisa que no meu monótono dia-a-dia nunca o faço, sempre que ouço o som do despertador a única coisa que faço é carregar no botão ’repetir’ e virar-me para o outro lado.
Abro as cortinas e a luz do dia ilumina todo o meu quarto, um belo dia lá fora espera-me, por isso preparo-me apressadamente para aproveitar ao máximo o dia.
Sinto-me uma pessoa completamente diferente e com outros objectivos de vida, no entanto um pouco desanimada pois descobri que a maioria das pessoas europeias não sabe o que é realmente viver e rege-se pelo materialismo. Tudo tem valor na vida das pessoas, no entanto esse valor é sempre atribuído ao material e não ao moral/espiritual. E esta, é a principal diferença entre os europeus e os indianos, a maneira de ver a vida.
Posso dizer que o mês que passei na Índia, foi um mês incrível para mim, um mês onde consegui repor e pensar nos meus valores, naquilo que realmente quero e preciso para levar uma vida em pleno. “Quero eu uma vida stressante mas com uma conta bancária bastante apetecível? Ou quero eu uma vida em pleno, com dinheiro suficiente para fazer tudo aquilo que me dá mais prazer?”, “E afinal quais são os meus prazeres? Um iate para dar uns passeios pela Riviera francesa ou uma auto descoberta?”. Bem que as duas me dão uma enorme satisfação, mas nesta viagem aprendi que o essencial é aquilo que possuímos interiormente e isso não quer dizer que deixemos de ter pequenos luxos, quer sim dizer que o mais importante é termos uma base, um apoio, uma personalidade e não um Ferrari, um anel de diamantes ou uma bolsa xpto. Se deixarei de lado os meus bens materiais? Não, mas de certeza que a partir de hoje vou passar a interessar-me muito mais com o ser e não com o parecer.